Isso é coisa de meia dúzia?

Uma cidade melhor não se faz apenas com obras. Se faz, acima de tudo, com mais diálogo e união entre as pessoas.

Cartão de Boas Festas do prefeito

Cartão de Boas Festas do prefeito

O texto acima não foi criação de nenhum manifestante que compareceu na reunião da COSMAM, foi apenas a leitura do cartão de Boas Festas do prefeito municipal José Fortunati, postado em seu Blog em dezembro de 2012. Curiosamente a foto do cartão mostrava também as árvores já derrubadas e outras que estão marcadas para serem cortadas.

Que tipo de diálogo o prefeito quer? O que ele entende por diálogo?

Este verdadeiro “arboricídio” projetado foi discutido com a população da cidade que, em sua grande maioria, adora suas árvores? Por que foi feito em silêncio, nas vésperas do Carnaval, com muita gente já fugindo do calor em direção às praias? Por sorte alguns jovens escutaram o barulho das motosserras e subindo nas árvores impediram a continuidade dos cortes. Mensagens de celulares e as redes sociais alertaram pessoas que foram ao local e depois dialogaram com vereadores na Cãmara Municipal.

Na Câmara dois representantes da SMAM e até alguns vereadores ficaram surpresos quando foi dito que, além da estupidez dos cortes de árvores, havia um gravame no Plano Diretor da cidade destinando aquela área para a formação do Parque do Gasômetro. Posteriormente, na reunião da COSMAM, os secretários presentes para “justificar” a ação predatória contra as árvores do Gasômetro nada falaram sobre o futuro Parque do Gasômetro, como se tivessem desconhecimento do Plano Diretor da cidade.

José Fortunati é tido como pessoa de opiniões firmes mas que nunca se furta de dialogar, mesmo que seja extremamente difícil alterar sua posição já tomada, por mais diálogo que exista. Se o prefeito deseja mais diálogo, poderia começar dialogando com seus secretários, alguns estão fazendo de tudo para estragar sua imagem política.

Poderia iniciar explicando a seus secretários, especialmente o da SMAM, que a população de Porto Alegre ama suas árvores e o Meio Ambiente, tanto que o Rio Grande do Sul é o berço do Movimento Ambientalista na América Latina. Precisa exemplificar? Basta lembrar as lutas dos pioneiros Balduíno Rambo, Henrique Roessler, José Lutzenberger, Augusto Carneiro, Hilda Zimmermann, Giselda Castro, Magda Renner, Flavio Lewgoy, o surgimento da pioneira AGAPAN em 1971 e a criação da SMAM (atualmente com prestígio tão abalado) – primeira secretaria de Meio Ambiente no Brasil –  pelo prefeito Villela em 1976.

Matéria na revista Veja em 5 de março de 1975 - reprodução arquivo Gonçalo de Carvalho (clique na imagem para ler a matéria)

Matéria na revista Veja em 5 de março de 1975 – reprodução arquivo Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho (clique na imagem para ler a matéria)

O prefeito Fortunati também poderia ensinar a seus secretários que em fevereiro de 1975 um estudante, como os que agora impediram o corte das árvores no dia 6, subiu em uma tipuana que seria removida para a construção de um viaduto na Av. João Pessoa. Seu ato pioneiro impediu o corte da árvore, alterou o projeto do viaduto e hoje tem seu nome em uma placa no muro da UFRGS, em frente da árvore que ainda existe lá. Era época da ditadura e Carlos Alberto Dayrell e dois colegas que depois o seguiram na subida da árvore foram tratados como “subversivos” tendo recebido um “corretivo” na base de cacetetes. Explique a seus secretários que assim que foi noticiada a subida na árvore do Dayrell isso levou centenas de pessoas que foram apoiar seu gesto, algumas levando safanões e ameaças de mordidas dos cães da polícia, mesmo assim não arredaram pé dali até que se soube que o prefeito cancelara o corte e que os estudantes foram liberados do DOPS, graças ao Lutzenberger e ao advogado Caio Lustosa.

Av. João Goulart atualmente - imagem do projeto da RP1/arquiteto Rogério Dal Molin

Av. João Goulart atualmente – imagem do projeto da RP1/arquiteto Rogério Dal Molin

Parque do Gasômetro - imagem do projeto da RP1/arquiteto Rogério Dal Molin

Parque do Gasômetro – imagem do projeto da RP1/arquiteto Rogério Dal Molin

Também deveria explicar, prefeito Fortunati, que o tal “Parque do Gasômetro” não é invenção dos ambientalistas e moradores do entorno neste momento de protestos para salvarem as árvores. Isso é coisa mais antiga. Como foi explicado ao senhor em 2007, que na época era secretário de Planejamento, numa visita de dois integrantes do recém criado Movimento Viva Gasômetro a seu gabinete. O senhor foi muito atencioso e mostrou interesse no que foi apresentado, chegando a elogiar muito as propostas comunitárias apresentadas que não eram restritas ao Centro da cidade.

Captura de tela da postagem do Blog do Movimento em 25 de junho de 2007. O "post" atualmente está inacessível pois as postagens antigas foram retiradas pela atual coordenação do Movimento.

Captura de tela da postagem do Blog do Movimento em 25 de junho de 2007. O “post” atualmente está inacessível pois as postagens antigas foram retiradas pela atual coordenação do Movimento.

Os integrantes do Movimento Jacqueline Sanchotene e Cesar Cardia (este também integrante do Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho e sócio benemérito da AMABI) na reunião com o secretário de Planejamento José Fortunati em 25 de junho de 2007.

Os integrantes do Movimento Viva Gasômetro, Jacqueline Sanchotene e Cesar Cardia (este também integrante do Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho e sócio benemérito da AMABI) na reunião com o secretário de Planejamento José Fortunati em 25 de junho de 2007.

Quando foi visitado em 2007, o atual prefeito soube que a criação do Parque do Gasômetro, ligaria a Praça do Aeromóvel (Julio Mesquita) com a Usina do Gasômetro e a Praça Brigadeiro Sampaio com o rebaixamento da Av. João Goulart. Soube também que o projeto original era do conselheiro da RGP1 (na ápoca), arquiteto Rogério Dal Molin. Na revisão do Plano Diretor da cidade a criação do Parque do Gasômetro foi apresentado pelo vereador Comasseto e APROVADO pelo plenário da Câmara Municipal. Logo, o alargamento da via com derrubada de árvores está CONTRA o Plano Diretor da cidade de Porto Alegre, pois ali será o PARQUE, a via será rebaixada, deverá passar por baixo do Parque.

Os Movimentos Sociais sempre querem o diálogo com o executivo municipal, mas a nossa realidade é outra. O executivo divulga querer dialogar mas se furta disso, quer apenas impor sua vontade, sem diálogos, sem ouvir as opiniões contrárias, mesmo que ao arrepio da LEI.

Cesar Cardia

Ex-integrante do Movimento Viva Gasômetro

Ex-conselheiro da RP1 junto ao CMDUA (2010/2011)

Integrante do Movimento Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho desde 2005

Sócio benemérito da AMABI – Associação dos Moradores e Amigos do Bairro Independência

Ex-participante do Fórum de Entidades para a Revisão do Plano Diretor de Porto Alegre

Reunião na COSMAM - Foto: Desirée Ferreira/CMPA

Reunião na COSMAM – Foto: Desirée Ferreira/CMPA

Trecho da matéria publicada no Jornal do Comércio (15/2/2013):

Manifestantes pediram saída de secretário

A resposta à afirmação do prefeito José Fortunati (PDT), de que “as pessoas não usam estas árvores”, ecoou no Plenário Ana Terra, quando, logo no início da reunião da comissão, alguém exclamou: “Quem respira, usa árvore!” A contestação deu a tônica da reunião da Cosmam.

Em meio aos impasses, os grupos presentes articularam um abaixo-assinado pedindo a saída de Záchia da pasta. Segundo a integrante estadual do grupo Os Verdes Eliane Carmanim Lima, o pedido já está sendo divulgado nas redes sociais. “Isso é coisa de meia dúzia e eu respeito a opinião de todos”, rebateu Záchia. A reunião foi encerrada com gritos de “Queremos árvores” e “Fora Záchia!”.

Origem do texto: http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=116398

Manifestantes contra o corte de árvores na COSMAM - Foto: Desirée Ferreira/CMPA

Manifestantes contra o corte de árvores na COSMAM – Foto: Desirée Ferreira/CMPA

A melhor frase do dia foi de uma manifestante que disse ao secretário do Meio Ambiente:

“já que não defendes o Meio Ambiente, RENUNCIA! Até o papa já renunciou, qual o problema?”

(Reunião na COSMAM -Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara Municipal – no dia 14 de fevereiro de 2013)

Ambientalistas e moradores reprovam a ação da prefeitura na reunião da COSMAM - Foto: Cesar Cardia/Amigos da Rua gonçalo de Carvalho

Ambientalistas e moradores reprovam a ação da prefeitura na reunião da COSMAM – Foto: Cesar Cardia/Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho

7 pensamentos sobre “Isso é coisa de meia dúzia?

  1. Pingback: Porto Alegre resiste pelas árvores e por todos nós! « anacarolinapontolivre

  2. Vamos cuidar das árvores que estão sendo plantadas e não são cuidadas, morrem e não se desenvolvem. Ex.: a nova parte da Rua Volunantários da Patria, perto da Arena do Grêmio, estão plantando árvores, sem cuidados estão morrendo. Podemos cortar uma árvores por ser necessário para melhorar a vida urbana. Plantar outras árvores e cuidar para que elas possam se desenvolver. Arsenio Frantz.

    • Devemos cuidar das arvores plantadas recentemente e principalmente das que já existem para que não sejam cortadas.
      Apenas 20% das mudas que são plantadas vingam e essas mudas demoram cerca de 2 gerações (40 anos) para estarem no estágio das que foram cortadas na Av. João Goulart, no Gasômetro.
      Como sabemos que as árvores cortadas no Gasômetro não serão mitigadas naquele local, o impacto ambiental será muito grande.
      Cabe lembrar que uma única árvore de grande porte absorve a poluição causada por 100 carros ao dia.
      Apenas muito excepcionalmente devemos permitir a retirada de árvores urbanas, como no caso de estarem apresentando riscos para a população.

    • Sr. Arsênio, parece que tudo é possível, mas não da maneira que foi feito não representa uma árvore mas grandes áreas de valor urbanístico e ambiental. As novas mudas estão sendo plantadas em solos pobres de canteiros e aterros, na Av. Borges um caminhão de pequeno porte caindo os pedaços vazia o plantio cavava o solo pedregoso e colocava a muda com duas pás de terra preta e lançava o resto da terra cavada anteriormente, cobria depois com tapete de grama, (que já não existe), as mudas estão sem folhas mas torço para que sobrevivam. Quando falei com os “pobres” que faziam o plantio, para que colocassem mais terra com húmus, estes ficaram envergonhados, vendo então a pobreza do terceirizado, que contava apenas com dois sacos de terra fértil e os quadrados de grama no caminhão, continuei meu caminho sem saber se doía mais o plantio inadequado ou a realidade de quem plantava. Vamos cuidar, mas cobrar os erros de quem?

  3. Há coisas interessantíssimas no Brasil e principalmente na nossa cidade.
    .
    Enquanto a prefeitura passa despercebido por todos a concorrência do projeto do Metro de Porto Alegre, esta sim uma obra que dará sustentabilidade a nossa cidade. Enquanto a Prefeitura introduz os BRTs no lugar dos não poluentes VLTs, ficam as nobres pessoas debatendo meia dúzia de árvores. Talvez na movimentação dessas pessoas de fino trato até os locais das reuniões já tenham sido consumido mais combustível do que o equivalente a plantar centenas de árvores, ou seja a questão do transporte coletivo é secundário.
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    Realmente, ônibus, bondes ou metrôs são meios de locomoção para pobres e não precisam ser discutidos por quem não os usa.

    • Rogério, uma boa parcela das pessoas que se pronunciam contra o corte de árvores são as mesmas que participaram da Revisão do Plano Diretor, criticam o executivo e legislativo por não ter um plano diretor de mobilidade urbana inserido no PDDUA, defendem transporte coletivo de qualidade e apoiaram um Plano Diretor Cicloviário mais abrangente e real, com ciclovias que realmente permitam as pessoas a se deslocarem a seus trabalhos, não apenas para passeio. Também foram os que pressionaram o executivo para colocarem lixeiras nas ruas e pedem conteineres para o lixo reciclável.
      Mas sabemos que apenas algumas dessas ações tem visibilidade, pois algumas ações tem mais destaque na mídia e redes sociais.
      Só para teres idéia, na Revisão do Plano Diretor foram reuniões semanais, até nas férias do legislativo, na Câmara por quase TRÊS anos, sem quse nenhuma divulgação na mídia, gerou 290 emendas mas que pouco mais de uma dúzia foram votadas em plenário. Foi um trabalho intenso e totalmente sem subvenções, até o cartaz e folheto explicativo foi feito pelo Fórum de Entidades (Associações de Moradores, Movimentos, Entidades Ambientalistas, etc), apenas a impressão foi pela Câmara.
      Por favor, Rogerio. Tens como colaborar, participa também. Caso residas em algum bairro da RGP1 (19 bairros) as reuniões são abertas a TODOS, mesmo não delegados eleitos. Só que apenas os eleitos como representantes (delegados) podem votar, mas muitas boas sugestões foram feitas por cidadãos comuns que lá foram para colaborar.

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